quarta-feira, 5 de setembro de 2007

A Palavra

Bem senhores, venho tardiamente estrear minha participação no blog, mas como sempre dizem que "antes tarde do que nunca", vamos lá.
Meu primeiro post eu gostaria que fosse sobre política ( só pra afrontar meu amigo T. Cardoso) mas um texto que li na web esses dias me chamou mais a atenção.
Senhores venho aqui propor e questionar a todos os estudantes o quanto vale a sua formação moral, sua opinião e o seu caráter? Antigamente (diga-se de passagem há muito tempo atrás) o homem se valia pela sua palavra, pelo dom de cumprir sua promessa, pois o que não o fazia não era considerado como tal pela sociedade, e até mesmo por uma questão de honra, até mesmo as camadas mais baixas da sociedades (e até entre os bandidos) se valiam pela palavra dada. Este texto escrito por Mário Persona, fala um pouco desses valores que o ser humano perdeu ao longo do tempo, mas que, não duvido que existam pessoas que ainda sigam princípios morais.


Três reais

por Mário Persona *

O táxi que me levava ao aeroporto era dirigido pela tartaruga em pessoa. Não que o motorista fosse lento. Não era. Apelidei-o de "tartaruga" só por ser enrugado e vivido.

E também por lembrar a tartaruga da fábula de Esopo, "A lebre e a tartaruga", recontada por La Fontaine, onde não é a autoconfiança que vence, mas a perseverança que vem do reconhecimento das próprias limitações. O motorista era assim. Velho e calejado de erros que não se preocupava em esconder.

De vez em quando faz bem encontrar alguém consciente de suas próprias falhas, de seus limites, e que não acredita tanto assim em si mesmo. Não, você não vai ouvir de mim a frase "acredite em si mesmo". Acreditar mesmo, só em Deus, que não pode falhar.

Todas as vezes que me empolguei e acreditei em mim mesmo descobri depois que eu estava mentindo para mim com o objetivo de me manipular. Acha estranho? Quando você se vir frente a frente consigo mesmo vai entender.
Depois de uma certa idade a gente começa a aprender o que é o ser humano -- e mais particularmente o "eu humano". Começa a entender que covardia, miopia, orgulho e mentira são acessórios que vêm de fábrica, prontos para usar. Qualquer pessoa tem potencial para falhar.

O problema é que tentamos nos convencer de que não falhamos e -- já que em todo crime sobra um corpo -- passamos a nos explicar e a procurar alguém para culpar, na tentativa de tirarmos o corpo fora.
Quando vira hábito passamos a vida procurando alguém pior para podermos nos comparar. Então o que bebe explica que não toma drogas, o viciado avisa que não rouba e o ladrão diz que não mata. Vai me dizer que você nunca se explicou assim?

Um pouco antes de entrar no táxi eu tinha trocado alguns minutos de prosa com alguém com o mesmo número de anos daquele motorista, mas que enxergava um mundo onde todos erravam, menos ele. Não que o motorista pensasse o contrário ou achasse todo mundo bom, menos ele. Na verdade ele não nutria ilusões acerca de pessoa alguma, ele incluso.

Ex-policial, contou do tempo em que era mandado participar, à paisana, de manifestações. Seu papel era distribuir bombinhas para assustar os cavalos da polícia e instigar manifestantes pacíficos a ficarem violentos. O objetivo? Fazer o pau comer para justificar o cassetete amplo, geral e irrestrito. Evidentemente ele saía antes.

Em outras ocasiões infiltrava-se em reuniões de manifestantes para descobrir quem estava patrocinando, só para descobrir o próprio governo por trás da manifestação daquele bando de manipulados que acreditava fazer oposição.
E foi depois de confessar que cumpria ordens das mais imorais, que contou ter transportado, no dia anterior, um passageiro costumeiro naquele trajeto até o aeroporto. Quando o passageiro -- um advogado do tipo lebre, apressado e autoconfiante -- reclamou da corrupção, o calejado motorista retrucou que corruptos todos somos.

Do alto de seus 26 anos de idade, o pequeno doutor se defendeu afirmando ser incorruptível, de reputação ilibada, lisura profissional imaculada, lhaneza no trato, e mais uma dúzia de adjetivos que mais se atribui quem menos tem.

Antes que o motorista pudesse explicar por que considerava todos -- inclusive a si próprio -- corruptíveis, tinham chegado ao destino. Depois de receber pela corrida, o motorista entregou ao advogado um cartão com uma sugestão:
-- Ao invés de chamar a Central de Rádio-Taxi, da próxima vez ligue direto para mim que vai economizar três reais, que é o que a central está levando nesta corrida. A gente faz o negócio por fora e a Central nem precisa saber.

-- Ótimo, vou fazer isso -- respondeu o advogado interessado -- É sempre bom economizar algum.

-- Bem, agora que já o convenci a chutar a Central para escanteio, como eu estava dizendo, que todos somos corruptos não resta dúvida. O que varia é o preço. No seu caso, três reais. Tá muito barato, doutor.

2 comentários:

Paskyn disse...

Que existam pessoas que cumpram com a palavra, sejam honestas, trilhem um caminho reto, possuam uma conduta imaculada e outros correlatos a um bom proceder, isso eu também não dúvido.
O que impressiona é como muitas vezes costumamos encontrar pessoas que acreditam que a falta de escrúpulos é um vírus tupiniquim. O brasileiro é, em geral, desonesto por que foi modelado a sê-lo. Mas ele (o brasileiro) não foi desde sempre assim. É bem verdade que pra esta Terra Brasilis vieram as corjas lusitanas, mas o fenômeno da corrupção moral é, ao meu ver, bem mais recente do que se faz crer. Se o problema fosse genético, a Austrália e a Nova Zelândia também mereceriam um posto de honra (?) no ranking do descaratismo, visto que foi pra lá que a Coroa inglesa despachou os presidiários britânicos "a fim de colonizar o continente-ilha".
Contudo bom é saber que ao menos para esse mal existe cura. O brasiliense foi condicionado a parar na faixa de pedestre apenas devido a certas manipulações de contingências o que acabou gerando uma (em geral) boa conduta do motorista. Se esse resultado pode ser conseguido para esse fim, é provável que o mesmo método (que não é tão moderno assim) possa ser generalizado para que se possa "moralizar" o brasileiro. Um bom exemplo é apenas reforçar aqueles comportamentos que as boas mâes costumam executar quando da educação de seus filhos.
-O muleque trouxe o carrinho do vizinho pra casa? Manda ele estender a mão, dê-lhe uma lapada bem dada de "havaiana" e mande-o devolver o pertence alheio.
Tem gente que hoje acha que esse tipo de disciplinamento é um crime. Pior ainda, acredita que tá fazendo uso de "psicologia infantil".
É por causa de pais e educadores com esse tipo de credo que proliferam-se os Renans, os Rorizes, os ACM's, os Delúbios...

M. Bertunes disse...

Meu garoto você não poderia ter me deixado mais orgulhoso com esse comentário.

Mas a questão é que você ainda não pegou a real essência do que eu tentei propor.

Então vamos simplificar:
O texto do Mário Persona é somente uma brilhantismo para a questão onde eu quero destacar esta frase " O problema é que tentamos nos convencer de que não falhamos"...

esse é um dos pontos cruciais do tema. O fato de sermos corruptos pouco importa (agora).
"Não, você não vai ouvir de mim a frase "acredite em si mesmo". Acreditar mesmo, só em Deus, que não pode falhar.

Todas as vezes que me empolguei e acreditei em mim mesmo descobri depois que eu estava mentindo para mim com o objetivo de me manipular. Acha estranho? Quando você se vir frente a frente consigo mesmo vai entender."
"já que em todo crime sobra um corpo -- passamos a nos explicar e a procurar alguém para culpar, na tentativa de tirarmos o corpo fora.
Quando vira hábito passamos a vida procurando alguém pior para podermos nos comparar. Então o que bebe explica que não toma drogas, o viciado avisa que não rouba e o ladrão diz que não mata. Vai me dizer que você nunca se explicou assim?"

Bem e por aí vai seguindo essa linha de raciocínio, não mostrando a culpa do outro e sim a SUA.

O que eu pretendo é uma análise do SEU comportamento, e não o do outro, porque julgar o outro é fácil, difícil é atribuir a culpa a você mesmo.