domingo, 26 de abril de 2009

Outono

Um Cachorro Bravo escreve:
Um tempo atrás eu recebi um e-mail daquele tipo mensagem motivacional em Power Point sobre o processo de renovação da águia. Muita gente deve ter recebido essa mensagem com um pedido final de enviar a pelo menos dez outros amigos mostrando o quanto você os ama e blá, blá blá...
Era sobre como supostamente a águia tem que, em determinada fase da vida, agir para prolongar seu tempo de vida. Ela teria que isolar-se no cume de uma montanha, quebrar o próprio bico, arrancar as garras e depenar-se. Durante este período ela seria alimentada por outras águias "companheiras" e então, depois de algum tempo, ela estaria renovada e poderia viver mais outros longos anos, com bico, penas e garras novos.
Seria uma bela história com conteúdo bastante para uma reflexão da vida e demais lições de moral de valor inestimável.
Só que depois eu descobri que um ornitólogo qualquer desses que aparecem por ai provou que essa história é uma grande bobagem, que esse comportamento jamais foi descrito em ave alguma, que a mensagem não passava de um spam romântico.
Realmente é uma pena que essa história seja uma mentira que alguém inventou talvez para levantar o moral de algum amigo e que depois se tornou um viral idiota que muitas vezes é mandado pra lixeira antes de ser aberto. Eu penso isso talvez por sentir que eu tô passando por um momento como esse, da águia de mentirinha. Um momento em que eu carrego vícios que precisam ser extintos se eu quiser me manter sobrevivendo. E talvez pra eliminar essa carga eu devesse me envolver num processo de introspecção e mutilação, uma coisa quase auto-redentora, pra que no fim eu pudesse enfrentar a vida novamente. Com novas forças.
Só que eu não consigo achar um cume de uma montanha. Todos os lugares parecem cheios e eu sinto uma asfixia excruciante.
Eu não sinto liberdade pra quebrar o meu bico. E acho que eu morro se eu fizer isso. Mantenho ele ainda que eu tenha mais prejuízos com essa manutenção do que em lançar ele fora. E eu tenho consciência disso.
E mais. Onde estão as minhas águias companheiras? De repente parece que as águias que poderiam estar me dando uma mão com isso ou estão voando a esmo ou também estão tentando se depenar. Pra essas últimas, embora eu sinta que não seria uma má idéia uma aproximação tendo em vista a similaridade da situação, prefiro deixá-las em paz pra não sobrecarregá-las com as dores do meu sacrifício.
No fim, já ciente da ficção dessa historinha, proponho uma irremediavelmente mais verdadeira. Foi o padre Antonio quem me ensinou essa.
A do caroço de manga.
Você sabe como é que se planta uma semente de manga? Não? Pois tem um segredo. Se você lançar um caroço de manga e plantá-lo, germinará um brotinho que logo em seguida vai morrer. É um aborto do mundo vegetal.
O certo, para que o broto se torne uma plantinha viçosa e depois converta-se numa árvore frondosa e frutífera, é que a semente morra antes. Você deve deixar que o caroço de manga seque completamente ao Sol. Quando ele estiver esturricado, com uma aparência cinzenta, morta, então é o momento de plantá-lo. Por que ai, por um processo que eu e o padre Antonio desconhecemos mas que provavelmente qualquer biólogo meia boca é capaz de explicar, o broto germina com força suficiente pra sobreviver.
Acho que é isso que eu preciso fazer. Morrer um pouco.
Vamo ver se eu aprendo a lição simples do caroço de manga, uma vez que a lição da águia, além de falsa e improvável é muito mais difícil de ser aprendida.

Um comentário:

Lobinho disse...

brothe... eu não vou lhe dar comidinha na boca, nem serei o sol que vai lhe esturricar, mas se no dia que vc for devolver meu livro quiser bater aquele plá tomando aquela cachaça, podemos nos unir.