sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Pensamentos, reflexões e opiniões em alguns dias de folga (parte II)

“Eu não amo só o dinheiro. Também tenho carinho por cartões de crédito e talões de cheque”.

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Cuba, os Jogos Pan-Americanos, a classe média brasileira e papagaio no YouTube
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Outro dia uma colega de trabalho, muito inteligente e competente por sinal, questionou minha simpatia pelo Hugo Chaves e pelo Fidel Castro.
Dizia ela:

-É muito bonito e romântico você, vivendo aqui no Brasil, dizer que gosta do Fidel. Queria ver você continuar gostando dele se tivesse que ir pra Cuba morar em condições sub-humanas naqueles cortiços em que vive a população de lá. E pior, tendo que ir todo dia a algum posto do governo pra pegar a ração do dia como se fosse um animal.

Ela tem razão. Se Skinner disse que provavelmente não se adaptaria a uma sociedade como Walden Two, também eu provavelmente não me adapte à Havana. Talvez eu realmente não goste nem um pouco de ter que ir pegar uma ração diária em algum posto do governo.

Pode ser por que eu seja mesmo muito preguiçoso.

Dói-me o coração só pensar em ter que me abalar do 4ª andar do prédio onde trabalho e andar cerca de 200m pra ir almoçar no Asa Gaúcha (o restaurante que tem o melhor churrasco e os funcionários mais honestos da Asa Norte). Tanto que agora eu estou levando uma marmitinha que eu esquento em três minutos no microondas que fica a menos de dez passos da minha mesa.
Eu moro numa das cidades mais carentes do Distrito Federal, mas apesar disso e da minha casa estar há mais de dois anos em reforma, eu gosto de morar nela. Eu tenho um quarto grande que eu divido com meu irmão do meio. Nesse quarto fica o meu computador e em uma das paredes tem um pôster gigante do Aerosmith. Do lado do pôster tem um quadro do Charlie Chaplin dando uma flor para uma moça de coxas rosadas, sentada na borda de uma fonte. Ao lado do meu quarto fica a sala. Lá tem uma televisão enorme, um aparelho de som combinado a um DVDplayer, meus cd’s, os cd’s da minha mãe e aqueles outros móveis e apetrechos que tem em toda sala de estar burguesa. Na cozinha tem geladeira, fogão, microondas, forno, uma mesa confortável e por aí vai. Na garagem, dois carros populares.
Meu pai é servidor público há duas décadas. Após esses anos de trabalho árduo (por que ele sempre realizou trabalho braçal, mesmo depois de ter feito uma especialização), ele conseguiu nos proporcionar essa pacata vidinha que minha mãe chama de classe média baixa. Com direito a assistência médica e odontológica.
Mas eu fico pensando nas pessoas que não tiveram essa mesma sorte. Eu não preciso ir muito longe. Na verdade, da minha casa eu não preciso andar mais do que alguns metros (menos até do que a distância entre minha mesa e o Asa Gaúcha) pra achar os desafortunados. Eu sei de pessoas que são quase meus vizinhos e que não sabem se vão comer amanhã. Pra essas pessoas às vezes falta de um tudo e elas contam os dias pra ir buscar a cesta básica que o governo dá. Algumas dessas pessoas vivem em casas que, pela forma como foram construídas, deviam ser interditadas pela Defesa Civil imediatamente. Essas pessoas não têm recursos pra ir à Pirenópolis esfriar a cabeça numa cachoeira ou pra ir esquentar a bunda em Caldas Novas. Essas pessoas nem sonham com um carro pra ir passear na feira no domingo.
Eu não viveria em Havana nem fodendo. Mas essas pessoas, se tivessem essa oportunidade, já estariam de malas (ou sacolas de supermercado, pra ser mais honesto) prontas. O Fidel Castro, no Diário Granma,(uma espécie de TvBrasil de Cuba) costuma propagandear:

-Milhares de pessoas estão passando fome no mundo neste momento. Nem uma delas é cubana.

Ele também pode dizer, com a boca cheia, que existem milhares de analfabetos no mundo, mas nenhum é cubano; que milhares de pessoas morrem em filas de hospitais, mas nenhuma é cubana, entre outras alegações que nenhum outro chefe-de-estado teria coragem de fazer (talvez só um suíço, um finlandês ou um cara-de-pau).
Mas nós os brasileiros fomos condicionados a chamar o presidente de Cuba de ditador (e a nossa mídia, me desculpe Sr. Bertunes, está nos condicionando a chamar o presidente da Venezuela, eleito por maioria de votos nas urnas e por referendo popular, de tenente-coronel). Durante o PANlhaçada-Americano, achamos graça e fortalecemos o nosso preconceito à Cuba quando vimos os atletas da terra do Fidel desertando. Foi muito fácil imaginar que a fuga deles era causada pelo regime fascista e opressor do ditador cubano. Foi muito fácil imaginar que eles fugiam da ração diária e dos cortiços fedidos. Engraçado que nós, ou pelo menos a nossa classe média, que tão superior se acha em relação à Cuba ou ao Piauí, demonstrou uma educação no mínimo espartana ao recepcionar os atletas das delegações estrangeiras. O líder máximo da nação não conseguiu abrir os jogos por conta das vaias, vergonha que nem mesmo Bush, se fosse abrir o campeonato mundial de queda-de-braço, passaria. O Pior é que o responsável direto pelo sucesso dos jogos foi o Governo Federal. A prefeitura do Rio (do DEMocrata mané César Maia) bateu na porta do Palácio do Planalto pedindo a candidatura da Cidade Maravilhosa para os jogos. O César Maia garantiu que quem bancaria tudo seria a iniciativa privada. O Rio venceu as eleições, mas na hora do “vamos ver”, a iniciativa privada deu pra trás. Sobrou pro Lula arcar com a dívida por que, caso contrário, a Cidade Maravilhosa iria passar vergonha. Na abertura dos Jogos, o coitado do barbudo foi lá achando que ia abafar na festa, mas os outros convidados já tinham tudo ensaiado pra expulsar o língua-presa que nem um cão sarnento.
De qualquer forma o PAN foi uma maravilha. Batemos recorde de medalhas. A primeira delas foi de um negão que ninguém mais lembra o nome. Só lembram que ele era a cara do Snoop Dog. Teve toda aquela patacoada da Globo com a história de “superação” do pobre garoto “neguinho” que venceu na vida. Ficamos emocionados e nos identificamos com os atletas. Nos sentimos mais brasileiros e por alguns instantes esquecemos as nossas diferenças. Por alguns momentos não havia miseráveis, classe média ou ricos. Teve até aquele geneticista falando que a Daiane dos Santos e o Diego Hipólito têm quase a mesma carga genética. Na verdade, se não me engano, ele foi mais longe. Segundo o geneticista, a Daiane tem mais carga genética européia e o Diego tem mais carga genética africana.

Foi lindo. E hipócrita.

Nossas diferenças ainda são bem visíveis. Estão estampadas na cara. Elas surgem quando dondocas dizem que uma mulher negra com um bebe branco no colo é indubitavelmente a babá. Elas surgem quando a Hebe aparece pondo a mão no peito e dizendo que “cansou” de ver o caos aéreo causado pelo presidente nordestino (aliás, esse caos aéreo é uma piada. Eu queria que a Hebe pusesse a mão no peito e dissesse que está cansada, mas de um problema que realmente afete a vida da maior parte dos brasileiros. Ela fica espantada com a quantidade de pessoas passando “aperreio” nos aeroportos? Ela devia experimentar ir ver o caos que é uma rodoviária, o caos que é andar de ônibus, o caos que é um ônibus da Viplan).



Elas surgem quando jovens acéfalos espancam a doméstica na parada de ônibus e se justificam dizendo que achavam que ela era uma prostituta. O mesmo raciocínio que usaram os otários de classe média ao espancarem essa doméstica foi usado pelo otário de classe média que gravou esse vídeo.

Agora eu tomo emprestado uma conclusão do Luiz Carlos Azenha. Afinal, já que uma empregada doméstica pode ser confundida com uma prostituta, o que na concepção deles é alvo de ponta-pés, nada impede que uma outra doméstica seja confundida com um papagaio.

4 comentários:

Anônimo disse...

vc tem que ver são os putos jogando ovos...
http://www.youtube.com/watch?v=963nxPbDifo

interessante o texto!

M. Bertunes disse...

meus parabéns mlk...

um excelente texto, dessa vez vou apenas deixar os parabéns e não uma crítica, pois foi excelente a forma como abordou o tema.

mas é claro as críticas( ou melhor o debate) vou deixar pra fazer pessoalmente.

flw mlk parabéns.

Paskyn disse...

Eu já tinha visto esses vídeos Fidel. Massa é ver o Boninho chamando as pessoas na rua de "vagabundos". Mas muito obrigado.
Valeu também meu caro Colestra!

Anime Downs disse...

Te dou os parabéns por esse texto!!!
E te advirto sobre nosso caro amigo M. Bertunes(colesta), pois ele esta muito calmo e isso não é normal....
te a proxima meu irmão...