Deus está sendo soterrado. O princípio indiferenciado não será restabelecido, já que há a indiferença. Separados do próprio eu, do outro, daquele que está em nós (Deus [vide Lucas, XVII, 21]) não é possível restaurar a ligadura. “Deus separou a luz das trevas” (Gênesis): o ato principial fora senão uma separação. Mas, o que estamos fazendo, e nós? Somos despropósito, e, ou, despropositados? Desintegrados, é bem o designo. Ser humano é infinitude, porém, caímos na finitude. Cá estamos nós: ‘espectadores, sempre, em toda parte, voltados para tudo e nunca para além’(Rilke). Deixamos de notar, observar, pormenorizar, sentir, compartilhar, acolher, ver, vislumbrar, contemplar, agitar, tocar, beijar, transar, amar, crer, e deixamos de deixar. A postura é egoística; a indiferença desintegra, separa, soterra.
Que caminho estamos trilhando? O sexo já não é erótico. Perdeu-se o laço eu - tu. Tem-se uma sexualidade banal, virtual; o sexual tem. O erótico complementa, compartilha; o erótico é.
Não existimos tão somente, somos. A onda é desprender-se das coisas, pois que ‘uma coisa obriga a considerar todas as coisas; e, terrível é a infinidade de um ponto’ (Carl Einstein). Pois bem, ser é ser potencialmente ilimitado, contudo, potências não efetivas geram ansiedades, angústias, vontades, frustrações, pecados, mortes. Sejamos aqueles que fruem o instante veloz; sejamos o fragmento da fragmentação vivêncial; esqueçamos a totalidade objetificante, e articulemos, restauremos num átimo, o todo, todo o ser.
“Finis origine pendet” (‘o fim depende do início’).
“O puro Espírito, de dor liberto, não se ocupa
Da Matéria, mas também não tem
Consciência de coisa alguma nem de si;
Para ele não há mundo, pois que fora dele
Nada há. [...]
Ora, o nosso ser sente os seus limites,
E a força reprimida luta impaciente
Contra as cadeias, e o Espírito aspira
A regressar ao imperturbado éter.
Há porém dentro em nós alguma coisa
Que gosta das cadeias; pois se em nós
O Divino não fosse limitado por nenhuma
Resistência – a nós não sentiríamos nem aos outros.
E não se sentir a si mesmo é que é a morte,
Não saber de nada, e ser aniquilado
É o mesmo para nós. [...]
Grande e indomável seja
O ’spírito do homem em suas exigências;
Nunca se curve à força da Natureza,
Mas atenda também à ajuda, já que ela vem
Da terra dos sentidos, não despreze
O que é nobre nas mortais roupagens.
Se a Natureza, aqui e além, e a seu modo,
Se harmoniza c’os seus tons, não se envergonhe
Ele da amigável companhia.”
Hölderlin
Da Matéria, mas também não tem
Consciência de coisa alguma nem de si;
Para ele não há mundo, pois que fora dele
Nada há. [...]
Ora, o nosso ser sente os seus limites,
E a força reprimida luta impaciente
Contra as cadeias, e o Espírito aspira
A regressar ao imperturbado éter.
Há porém dentro em nós alguma coisa
Que gosta das cadeias; pois se em nós
O Divino não fosse limitado por nenhuma
Resistência – a nós não sentiríamos nem aos outros.
E não se sentir a si mesmo é que é a morte,
Não saber de nada, e ser aniquilado
É o mesmo para nós. [...]
Grande e indomável seja
O ’spírito do homem em suas exigências;
Nunca se curve à força da Natureza,
Mas atenda também à ajuda, já que ela vem
Da terra dos sentidos, não despreze
O que é nobre nas mortais roupagens.
Se a Natureza, aqui e além, e a seu modo,
Se harmoniza c’os seus tons, não se envergonhe
Ele da amigável companhia.”
Hölderlin
2 comentários:
muito do caralho o texto.
perdemos a ligação mesmo eu-tu.
por isso que eu sempre quis fazer filosofia, dá pra escrever umas coisas bem inteligentes!!
abraço ao autor, até então desconhecido pessoalmente.
Eu faço coro com o Russo aí: EU QUERO UMA BEBIDA!
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